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sexta-feira, 25 de março de 2011

O fim da Eldorado FM

A Eldorado FM será despejada de seu tradicional endereço no dial nos primeiros minutos do próximo domingo. Na data, 27 de março, toma posse dos 92,9 a rádio Estadão ESPN, com notícias e esportes 24 horas por dia.
A tão conceituada FM musical será hóspede nos 107,3 e ‘ganha’ até sobrenome: Eldorado Brasil 3000 (???). Uma parceria estranha que, provavelmente, desagradará a gregos e troianos. Além disso, a freqüência da atual Brasil 2000 nunca foi um exemplo de potência. O sinal é fraco e mal cobre a cidade inteira.
É o começo do fim da Eldorado FM! Afinal, quanto tempo vai durar essa ‘fusão’? Dois, três, cinco anos? E depois?
Quem não vive na capital paulista e lê esse blog merece uma explicação. Eu tenho uma relação de amor profundo com a Eldorado FM. Talvez, por isso, é difícil escrever esse texto; há uma carga grande de emoção em jogo e são tantas as histórias... Mas vamos lá tentar dar uma visão geral do assunto.
No começo dos anos 80, a Eldorado era totalmente inexpressiva no cenário FM de São Paulo. Era, até o João Lara Mesquita assumir e dar início à transformação. Com intuição aguçada, dedicação total, trabalho minucioso, muita competência, driblando problemas técnicos e dificuldades financeiras, ele ‘levantou’ a FM. Aos poucos a Eldorado foi conquistando seu espaço e se firmando como uma rádio inovadora, diferente, produzida. Não demorou para ganhar prestígio e respeito.
Eu trabalhei na Eldorado FM; comecei por lá em 1987, após mais de 8 anos de Bandeirantes. Foi uma experiência que marcou minha carreira. Na época, a rádio, já estruturada, lapidava os seus diferenciais: qualidade musical, excelência da locução (alguns dos melhores profissionais do mercado passaram por lá) e criatividade, muita criatividade.
A equipe, sob o comando do João, era enxuta, coesa e super integrada. Um time, no melhor sentido da palavra, com objetivo bem claro: fazer uma rádio com personalidade e estilo. Elegante, mas sem deixar de ser descontraída, alegre e jovial.
Ousada, a FM abriu espaço para uma série de esportes bem pouco divulgados pela mídia em geral: trial, enduro, balonismo, canoagem, rali, provas de off-shore (só para citar alguns) e, iatismo: sua marca registrada. A Eldorado acompanhava todas as grandes competições de dentro dos veleiros e, depois, levava aos ouvintes cada movimento da tripulação – a adrenalina da largada, o trabalho à bordo, as trocas de velas, o planejamento estratégico, enfim tudo o que acontece durante uma regata.
Na época, a rádio não dispunha de equipamentos de ponta ou facilidades tecnológicas, mas isso nunca foi uma barreira à imaginação e à realização. Ao contrário, os desafios eram um estímulo a mais. Nada era impossível.
Um exemplo: sem celular, laptop ou qualquer outra parafernália existente hoje, a Eldorado (leia-se João, porque ele nunca se limitou a apenas dirigir a rádio atrás de uma mesa de diretor executivo; ao contrário, sempre fez questão de ‘por a mão na massa’) fez a cobertura do rali Paris-Dakar de 1989, direto das areias escaldantes dos desertos africanos. Na raça, na marra!... E todos os momentos – divertidos, de apreensão, de alegria, de emoção – foram ao ar em uma série de programas especiais diários, durante e depois da prova. Agora, dá pra imaginar isso no fim dos anos 80? Época em que o único contato possível entre o deserto e o resto do mundo era via satélite e a preço de ouro o minuto?... Mas, demos um jeito; o nosso jeito e o trabalho foi um sucesso.
Muitas outras coberturas foram realizadas assim. Através delas (que utilizavam o som ambiente, os ‘ruídos’ de cada esporte, a emoção do momento) a Eldorado FM tentava restituir ao rádio o seu status de ‘veiculo da magia’ que, através do som, instiga a imaginação e faz cada um dos ouvintes experimentar sensações únicas e individuais.
A programação musical da rádio é um diferencial, até hoje. A Eldorado FM nunca se rendeu ao sucesso ‘fabricado’; ao contrário, a missão dos programadores sempre foi buscar a melhor música e ‘descobrir’ novos ou esquecidos talentos.
Quando eram poucos os que ‘pensavam’ em ecologia e meio-ambiente, a Eldorado já abria espaço para o assunto. Quando pouco se falava em cidadania, lá estava a marca da rádio apoiando campanhas. São tantas as realizações, não dá para falar de tudo.
Em resumo: a Eldorado FM fez escola. O trabalho diário, incansável, persistente, ousado e criativo concretizou uma marca de prestígio, que carrega um conceito de qualidade que poucas outras tem, e fixou seu endereço no dial: 92,9... Um legado, prestes a acabar.
PS.: A Eldorado AM também ‘desaparece’ no domingo; em seu lugar estréia a rádio Estadão ESPN.
(Quem quiser saber mais detalhes dessa história, procure o livro ‘Eldorado, rádio Cidadã’, de João Lara Mesquita – editora 3º Nome. Garanto que vale a pena).

segunda-feira, 7 de março de 2011

Eu só queria ver a Portela...

Ontem dei uma passadinha pela rede Globo pra ver a transmissão do desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro. Queria ver a Portela.
Fiquei impressionada com a transmissão, mas não positivamente.
É praticamente impossível acompanhar o desfile tamanho o número de interrupções de apresentadores, convidados, repórteres. Um querendo passar mais ‘conhecimento’ do que o outro. Um atropelando o outro para mostrar familiaridade/intimidade com os ‘famosos quem’... Muitas entrevistas-relâmpago do tipo: ‘estou aqui com fulano/fulana que acabou de desfilar’... e a inevitável pergunta/afirmação ‘é muita emoção, né?’... Comentários óbvios: ‘olha que lindas as cores dessa ala’... Eu to vendo! Não precisa dizer que tem amarelo, laranja, azul, verde...
Além, é claro, das explicações do enredo: ‘essa ala representa...’, ‘olha o carro que traz...’, ‘a fantasia das baianas mostra...’.
E não para por aí, tem que ‘explicar’ também a coreografia da comissão de frente e seu ‘significado’ dentro do enredo!!!! E pensar que as imagens deveriam ‘falar por si’!... Achou que acabou? Engano... transmissão que se preze tem que ter as ‘apresentações’: ‘taí o mestre da bateria...’ ‘olha aí o primeiro casal de Mestre Sala e Porta-Bandeira’... ‘essa é a rainha da bateria’ (sem falar que tem legenda na tela!!!). E tudo na base do grito, porque o som da bateria é poderoso (pena que não o suficiente para nos poupar de tanta besteira).
É tanta falação inútil que é quase impossível acompanhar a letra do samba – nem mesmo quando aparece no vídeo... Porque nessa hora, é obvio, vem mais ‘esclarecimentos’. Haja! Dá vontade de tirar o som. Aliás, com tanta tecnologia disponível, deveria haver a possibilidade de um segundo canal de som – direto da passarela, sem os apresentadores.
Eu já começo a lutar contra o sono... Tento bravamente vencer a tentação de desligar a TV, virar de lado e dormir, porque eu quero ver a Portela!
Mas o show continua deixando a desejar...
A direção de imagem é alucinada e alucinante, mal dá pra curtir alguns detalhes. É um tal de corta aqui, passa pra lá, retorna acolá, que quem está assistindo fica sem saber em que parte o desfile está. Isso sem falar dos closes nos destaques e naquele bando de ‘celebridades’ que só os iniciados na ‘arte dos barracões’ ou os seguidores de realities shows conhecem... Os realmente famosos aos olhos do mundo (e do resto do Brasil) são poucos...
Aí eu pergunto: pra que tanta explicação, por que tanto frenesi? O que interessa é ver a escola, ouvir o seu samba – se possível cantar junto- curtir o colorido do conjunto, achar bom ou ruim e torcer para que a sua preferida ganhe... Pouco me interessa o enredo – mesmo porque normalmente eles não tem pé nem cabeça (salvo quando homenageiam algum personagem). Pouco me interessa quem é quem naquele palco improvisado; deixem que eu mesma reconheça os que têm alguma relevância – caso do Paulinho da Viola, que deveria dispensar apresentação.
Na minha modesta opinião, as escolas de samba – sejam do Rio ou de São Paulo, estão pasteurizadas, mecanizadas, burocratizadas. Sai uma, entra outra e parece uma coisa só. Até os sambas são semelhantes na melodia, no andamento; tente cantar a letra de um com a música de outro, é bem provável que você consiga. Os desfiles são engessados, regrados, quase monótonos – tudo tem que ser perfeito para agradar aos juízes. Os integrantes – em número cada vez maior – perderam a espontaneidade . Alguns, passam quase correndo; outros estão tão ocupados segurando chapéus e adereços que esquecem até de se divertir na passarela; muitos nem cantam o samba.
A criatividade, a ousadia, a crítica inteligente ficaram para trás (lembra dos desfiles polêmicos do Joãosinho Trinta?). As pessoas comuns que brilhavam ao mostrar suas maestrias e habilidades se transformaram em meros coadjuvantes sem a menor importância. Perderam para as figurinhas carimbadas da mídia em geral que tomaram os postos de reis e rainhas de quem realmente tem a majestade.
Por um punhado de grana – que enriquece uns poucos e não muda nada para a grande maioria que vive o dia a dia das escolas – transformaram a mais pura manifestação da criatividade popular em um espetáculo industrializado e quase patético. Os desfiles das escolas de samba não são mais para o público em geral – seja desfilando ou pagando ingresso. Eles acontecem apenas para ser exibidos pela TV, cuja transmissão é, também, cada vez menos preocupada com o publico espectador e mais com o massagear de egos de apresentadores, repórteres e convidados especiais.
Ah... eu comecei dizendo que queria ver a Portela. Juro como tentei. Mas, diante da xaropada da transmissão, cochilei no meio do primeiro desfile, perdi a segunda apresentação e só consegui acompanhar alguns momentos da famosa escola em azul e branco.
Conclusão: o auto-denominado ‘maior espetáculo da Terra’ não passa de um show pra boi dormir!